Luiz Eduardo Costa
Luiz Eduardo Costa | Jornalista
TEXTOS ANTIVIRAIS (63)
25/05/2021
TEXTOS ANTIVIRAIS (63)

POLÍTICA AINDA É ARTE DE SOMAR, ANDRÉ E MITIDIERI SABEM DISSO

(André e Mitidieri anunciaram a Sergipe a aliança e foram percorrer o sertão com Heleno Silva)

O fato político do ano, salvo a ocorrência de outros nesses sete meses que restam, foi, sem dúvidas, a anunciada aproximação política entre o deputado federal Fábio Mitidieri e o ex-deputado, ex-líder do governo Temer, André Moura. Os dois, juntos, lideram um bloco coeso de prefeitos, e existem casos em alguns municípios, onde opositores também estariam no mesmo palanque. Isso se traduz em força eleitoral, e justamente por isso, começa a definir-se o cenário político-eleitoral para a sucessão do governador Belivaldo Chagas. Poucos dias após o anúncio, Belivaldo, sintomaticamente, voltou a reiterar a sua disposição de não ser candidato, assim, permanecendo no governo até o último dia do mandato. Este, é outro fator que pesará na composição da chapa majoritária e também, consequentemente, no resultado do pleito.

Pelo andar da carruagem, se pode entender que tanto André como Mitidieri esperam compor uma chapa majoritária, e, nesse sentido, visualizariam, na aliança, um modelo que contemple e una os projetos comuns.

A integração desse novo grupo ao mesmo bloco agora governista, parece ser um desejo comum, e até lógico, visto que o deputado Mitidieri já integra a base de apoio a Belivaldo.

As mãos dadas dos dois políticos, no caso, sem as reservas que a pandemia impõe, mereceram um anúncio “urbe et orbi” por uma cadeia de emissoras que raramente se forma: a rede Xodó, a rede Grande Rio e a Xingó FM, no alto sertão de Canindé. Assim, o impacto político chegou ao mesmo tempo a todo o estado, e esta era, exatamente, a meta do ex-deputado federal e ex-prefeito de Canindé, Heleno Silva, um dos articuladores mais ativos da somação que se faz, exatamente com o propósito de multiplicar votos. Heleno, agora candidato a deputado federal, vem apontando aos dois, os caminhos sertanejos que ele há tanto tempo percorre.

André surgiu com força na última eleição disputando o Senado, mas, uma falha de estratégia o levou a uma impensável derrota, da mesma forma como ocorreu com o ex-senador Valadares, até a véspera da eleição liderando em todas as pesquisas, isso, numa equivocada dupla eleição, onde seu filho era candidato ao governo, e acabou, também, sofrendo um acachapante revés.

André era visto pela sociedade com reservas por ser o líder do governo impopular de Michel Temer, do qual agora, diante das circunstancias, dele até se sente saudade. Hoje, tudo indica que os candidatos se apresentarão aos eleitores sem atrelamentos maiores no plano federal, a depender, claro, do cenário que vier a ser formado. André, deve ter ficado muito satisfeito com uma longa matéria veiculada na Globo News, onde cariocas se queixam de que ele, sendo representante em Brasília do governo fluminense, esteja ainda carreando verbas para o seu estado Sergipe. André entenderia que são ciúmes injustificados, mas, no íntimo, deve sentir-se gratificado pelo reconhecimento vindo de críticos que ciumam do seu ativismo em favor de Sergipe.

Mitidieri, tem sido um interlocutor permanente em Brasília, onde os que o procuram recebem a devida atenção, e isso, o fez crescer politicamente.

Com efeito, não se contentam a todos, apenas com emendas ao orçamento. Na verdade, o critério dessas emendas precisa passar por reformulações, principalmente na necessária obediência a pautas priorizando questões essencialmente ligadas ao desenvolvimento. Sergipe tem 46 dos seus 75 municípios em estado de indigência financeira, e com um péssimo nível de qualidade de vida. Surpreendentemente, essa cifra, nada confortável, ainda fica muito abaixo das outras indicando pobreza mais alarmante em estados nordestinos. Algo precisa ser feito para superar essas situações. Temos, arrastando-se há trinta anos a BR-101, que poderia ser objeto de emendas de bancada, para um possível reinício das obras. São questões assim, que terão de ser pesadas e levadas em conta para a formatação de um discurso político que venha a ser mais abrangente.

O quadro está delineado, todavia nada definido.

O prefeito de Aracaju, Edvaldo Nogueira, que vem fazendo uma administração muito bem avaliada, poderia ser seduzido pela passagem de um cavalo selado, revelando uma cifra de aceitação em Aracaju rondando pela casa dos 70%, aí, ele poderia reavaliar o risco de deixar um mandato antes de completar dois anos no exercício.

O deputado Laércio Oliveira, também positivamente avaliado no seu trabalho focado em questões vitais do nosso desenvolvimento, é, sem dúvida, pretendente a um cargo majoritário.

Dessa forma, a aliança André-Mitidieri que se anuncia, terá de expandir-se em direção à outras pretensões, e, conseguindo contemplá-las, o que requererá um trabalho de cuidadosa artesania política a ser desempenhado mais fortemente pelo governador Belivaldo, poderá, então, transformar-se num bloco, que, na conjuntura de hoje, poderá ser estimado com muito mais chances de sucesso.

A candidatura do senador Rogério Carvalho parece a esta altura irreversível. Ele pode ser candidato no meio de um mandato de senador, e isso é oportunidade única. O mesmo sucede com o senador Alessandro Vieira, que se projeta muito bem na sua atuação parlamentar de alto nível, mas, como teve uma eleição insólita, sem base de sustentação eleitoral, poderá ter sido beneficiado por uma circunstância que dificilmente se repetiria.

Mas nenhum dos dois poderá ser descartado como opções num pleito que deverá revelar novas surpresas.

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O CAPITÃO NA “SUA” MOTOCICLETA

(Mussolini em 1933, Bolsonaro em 2021, os mesmos hábitos, os mesmos sentimentos?)

Montar numa Harley Davidson e pegar a US Route 66, era, ou ainda é, para muitos motoqueiros a realização de um sonho. Os jovens dos anos sessenta e dai por diante, fizeram os quase 4 mil quilômetros da rota movidos por um espírito libertário, uma jornada anti-caretice. Jack Kerouac, um péssimo escritor, esmerou-se, todavia, em traduzir nos seus livros essas confusas ânsias libertárias. E virou celebridade.

Tempos dos hippies, do rock, das novas drogas químicas que forjavam um mundo em cores psicodélicas, e, nas motos, os horizontes largos, os ventos fustigando o rosto emolduravam um delírio existencial, onde cabiam adesões ao sexo livre, à droga em cada esquina, e a todas as transgressões. Completando o delírio houve, em novembro de 1968, uma improvisação improvável, e que deu certo: o Festival de Música e Arte de Woodstock. De repente, a miúda cidade de Betel nos Estados Unidos era buscada no mapa como referência ao que andava pela cabeça daquela juventude proclamando, aos sons das guitarras que sufocavam os clarins: “Faça Amor. Não faça a Guerra”.

Nos atoleiros permeando o campo onde as bandas se revezavam, 400 mil pessoas em êxtases, misturavam-se no lameiro de fim de outono. Por aqueles caminhos enfileiravam-se motos, que, ao lado de Jimi Hendrix, Janis Joplin, Santana, The Who, e tantos outros nascendo para a fama, incorporavam-se, definitivamente, ao cenário da contracultura.

Há quem diga sobre aqueles frenéticos três dias onde milhões de hamburguers foram consumidos: “foi um recorde de larica, somente superado quando começou o Rock in Rio.”

Curiosidade evidenciando uma das melhores características da sociedade americana: Woodstock foi o emblemático momento de alerta para a insanidade da guerra no Vietnã, apesar disso, em vez de mandar a polícia, o governo americano enviou helicópteros militares levando comida, preservativos e absorventes, para a boca e os corpos de dezenas de milhares de jovens. A “erva” não precisou vir voando de longe; ela existe, sempre, em qualquer ponto, garantida pela capilaridade da rede global de abastecimento.

Dez anos antes de Woodstock um pós-adolescente argentino chamado Ernesto Guevara de La Serna, naquele dilema sobre os caminhos a tomar na vida, pegou uma motocicleta e saiu a procurá-los pela vastidão da Latinoamérica.

A miséria do povo o indignou, surgiu o revolucionário, que, restritamente, atribuiu a culpa por tudo aquilo ao imperialismo americano. E encontrou o seu caminho que seria combatê-lo, espalhando focos revolucionários pelas montanhas da América Latina, África e Ásia, ou seja, pelo mundo subdesenvolvido. Eram vastas as ambições.

Tendo trocado a motocicleta por uma metralhadora, logo tornou-se o Che. Cansado, ou decepcionado com o poder em Cuba, abandonou tudo, cercou-se de uns poucos, e foi dar continuidade à guerra de guerrilha nas selvas da Bolívia, onde imaginava receber um amplo e decisivo apoio do povo boliviano, tão pobre, tão espoliado.

Derrotado, abandonado, tuberculoso e sozinho, vagando fugitivo pelos ermos ásperos dos contrafortes andinos, quando o tenente do exército boliviano Gary Prado, treinado pela CIA anunciou, com a metralhadora apontada, que iria ali mesmo fuzilá-lo, num átimo de segundo, o cabisbaixo Che deve ter imaginado: Perdi aqui, subjugado pelas armas, e perdi também em Havana, quando, vencedor, imaginei que acionando gatilhos e derramando sangue, se poderia construir o mundo que eu tão egoisticamente sonhei.

Montado naquela moto que não é dele, é do Estado brasileiro, o ex-capitão Bolsonaro deve imaginar-se dono da força, então, teria chegado o momento de impor ao país ideias exclusivas dele, e de uma fanatizada minoria. Sequer, conseguem verbalizá-las com algum vestígio de sensatez, mas, delas fazem um quadro grotesco, inspirados pela estreiteza e obscurantismo das mentes confusas e turbulentas, oficinas perversas de fabricar ódios e naturalizar a morte. Isso, muitas vezes, imaginando que fazem bem a eles próprios e à sociedade brasileira.

Desde que assumiu o governo Bolsonaro não tem feito outra coisa a não ser aprofundar divergências. De uma tragédia, faz o palco sinistro para as suas insaciáveis ambições pessoais.

Essas manifestações ruidosas custam caro aos cofres públicos. Para reforçar a segurança do capitão motoqueiro e sua turba, (onde surgiam aqueles usando camisetas estampando macabra caveira atravessada por duas facas assustadoras) calcula-se, que dos cofres do Rio de Janeiro, um estado semifalido, saiu algo próximo a um milhão de reais, sem contar o deslocamento da caravana brasiliense do Planalto, viajando em aviões, helicópteros, e deslocando-se em possantes carros blindados.

Os que usam camisas assustadoras, assim definindo uma empatia com a violência, nas próximas caravanas motoqueiras imaginam exibir armas, tal e qual fazem nos morros cariocas os traficantes e milicianos, muitos dos quais poderiam participar do séquito presidencial, até mesmo porque, com esses últimos existiriam afinidades.

Esses passeios de moto se repetirão, a cada semana em uma cidade brasileira. A próxima, já se anuncia, será em São Paulo.

Mas isso é campanha eleitoral? Fazê-la com dinheiro publico é corrupção e acinte ao povo brasileiro, imerso agora em três tragédias: a pandemia, a fome, e o vírus que avança numa moto.

Qual o resultado prático desses passeios motorizados para o Brasil, para o povo brasileiro?

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A MOTO DO CAPITÃO ATROPELA GENERAIS

(Pazzuelo depois de mais de 50 anos é o primeiro general da ativa a aparecer e falar num palanque eleitoral. Bolsonaro desrespeitando normas das Forças Armadas)

Sobre a cena degenerada e triste do general Pazzuelo num palanque eleitoral ao lado do presidente, disse o general reformado Santos Cruz, um nome respeitado no Exército: “De soldado a general têm que ser as mesmas normas e valores. O presidente, e um militar da ativa, mergulharem o Exército na política, é irresponsável e perigoso. Desrespeitaram a Instituição. Um mau exemplo que não deve ser seguido. Péssimo para o Brasil”.

Por sua vez, o general reformado Hamilton Mourão, vice-presidente da República, disse: “Pazzuelo sabe o erro que cometeu, ele já deve ter ido se explicar no Comando. E a sua passagem para a reserva será a solução”.

Antes desse episódio o general Mourão repetiu algumas vezes: “Quando a política entra pela porta da frente dos quartéis, a disciplina e hierarquia saem pelos fundos”.

Já o general Heleno, reformado, e um dos que integram o grupo do Planalto mais identificado com o presidente Bolsonaro, disse: “Militar da ativa não pode participar de eventos políticos. Se isso acontece a imagem do Exército fica comprometida. Pazzuelo deve ir para a reserva”.

Bolsonaro, quando chamou Pazzuelo para acompanhá-lo no impróprio e extemporâneo desfile de motos, sabia que iniciaria um perigoso processo ameaçando a quebra da hierarquia e disciplina no Exército.

Desde a redemocratização do país em 1985, não se falava em crise militar, em generais fazendo política. Saíram do poder onde estavam há 21 anos e foram dedicar-se exclusivamente à sua profissão, que é repleta de regras e exigências, essenciais para que o Poder Armado não degenere, metamorfoseando-se em milícias a serviço de projetos pessoais.

Castello Branco, primeiro presidente do regime militar, pode parecer até paradoxal,(mas era resultado de uma visão lúcida , afinada com os melhores princípios de nações civilizadas) foi o primeiro a entender o perigo da politica invadindo os quartéis, e tomou decisões importantes, como a redução do tempo dos generais em seus postos, a fim de evitar o surgimento de lideranças fardadas, ocupando, junto com civis políticos os espaços em palanques eleitorais. Castello não teve êxito, porque quase foi deposto pela onda dos oficiais de menor patente, integrantes de um novo “partido”, a “linha-dura”, que o fizeram engolir a candidatura do seu colega marechal Costa e Silva. Por sua vez, Costa e Silva, hesitando em atender o desejo dos radicais, inflamados pelo verbo incendiário de um especialista em jogar gasolina nas casernas esbraseadas, Carlos Lacerda, escolheu, entre ser deposto, ou editar a excrescência que veio a ser conhecida como sinônimo do totalitarismo que, por algum tempo, baixou a Ordem do Dia no Brasil: o Ato Institucional nº 5.

O presidente Geisel, austero e rigoroso general, cultor dos sentimentos de honra, dignidade pessoal, comedimento e sobretudo compostura, transmitidos nas melhores escolas militares, correu o risco de uma guerra civil, mas, exonerando o seu ministro do Exército Sílvio Frota conteve a onda desatinada de ambições marchando em ordem unida com o que de pior pode existir na política: o extremismo ideológico.

Geisel entendia, sensatamente, que um país com uma sociedade pluralista como são todos os civilizados, não pode ser governado por extremistas, e muito menos aqueles com suas mentes turbadas pelo fanatismo ideológico. Por isso, ele buscou resguardar os quartéis dos “políticos fardados”, ou vice versa.

Foram tempos inquietos aqueles, em que pelos quartéis a dentro penetravam as divergências entre facções partidárias e ideológicas. A década dos anos vinte assistiu uma série de rebeliões armadas. Nos anos trinta, tivemos as duas tentativas de tomada do poder pelas armas, a primeira em 1935, liderada por fardados que colocavam no peito a efígie da foice e do martelo. Eram os comunistas, em plena era do stalinismo expansionista na União Soviética; depois, em 1938, houve a rebelião dos chamados “galinhas verdes” os Integralistas, ou fascismo à moda brasileira. Eles seguiam a linha de dois outros ditadores terrificantes: Hitler e Mussolini. Getúlio mandou todos se juntarem nos degredos do seu Estado Novo, feito à imagem do fascismo italiano.

Quando Bolsonaro no alto de um palanque eleitoral, tripudiando sobre os 450 mil mortos, desafiando normas e regramentos oriundos do seu próprio governo, a ele leva o general Pazuello, transformado no seu boneco de carnaval pernambucano, balançando para onde se manda balançar, ele transgride regras e valores essenciais que, como ex-militar, (um mau militar, segundo o general Geisel) e agora Chefe Supremo das Forças Armadas, deveria conhecer e respeitar.

Tudo faz crer que Bolsonaro alimente um projeto de poder, onde os militares, pela sua cultura de disciplina e hierarquia não lhe serviriam, daí, essa ânsia desatinada de transformar as Forças Armadas em milícias. Difícil vai ser convencer o generalato, os militares brasileiros em geral, a trocarem a farda por uma camisa com facas e caveiras.

 

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