No meio de malucos desse tipo, caberia a figura nobre de um Magnífico Reitor.
Aonde se supõe que deva estar um Magnífico Reitor?
Em princípio, e pela tradição das Universidades como espaços livres do pensamento, ele, o Magnífico Reitor, deve estar na esfera da Razão, ou empenhado na sua busca.
A busca e a defesa da Razão é, também, um imperativo do Saber, e uma afirmação da liberdade de consciência.
Viralizaram nas redes sociais, nesses últimos dias, fotos do Magnífico Reitor da Universidade Tiradentes, professor Jouberto Uchôa de Mendonça, e sua esposa a vice-reitora Amélia, confraternizando, (se aqui seria cabível esta palavra) com o grupelho de gente, talvez desocupada, insultando as Forças Armadas brasileiras em frente ao Quartel do 28º BC, pedindo uma intervenção militar. Ignoram, talvez, que os integrantes das três Forças, têm um jurado compromisso com a Carta Magna do país. E não se confundem com milícias particulares a serviço de projetos pessoais de poder. São uma instituição permanente do Estado brasileiro.
O respeito ao voto e à soberania popular, bem como a manutenção do Estado Democrático de Direito, são algumas das mais assertivas cláusulas da Constituição de 1988, que não podem ser ignoradas ou substituídas. São as chamadas Cláusulas Pétreas.
Esse grupelho insano, surgiu em mais de vinte estados, e tendo a mesma característica, inclusive de vestes e mensagens que exibiam, alguns fazendo um gestual nazista, o que teria gerado indignação nos representantes diplomáticos da Alemanha e Israel.
Tivemos uma eleição livre, democrática, demonstrando a eficácia técnica fantástica do nosso sistema eleitoral. A chapa vencedora foi anunciada pelo TSE em pouco mais de três horas após o fechamento das urnas. Um fato inédito nas grande democracias, entre as quais o Brasil surge, ou ressurge, merecedor de admiração e respeito. O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, foi o primeiro entre dezenas de Chefes de Estado, que não apenas cumprimentaram formalmente o vencedor, mas, também, externaram o desejo de formarem com ele uma parceria para o avanço das principais pautas, que hoje preocupam o mundo civilizado.
Apesar da máquina do Estado ter sido escancaradamente colocada a serviço do candidato derrotado (e se ele vencesse não caberia contestação sobre isso, porque não se poderia aferir quanto teria sido a influencia exercida sobre os votantes) apenas, caberia a Lula cumprimenta-lo formalmente pela vitória, e desejar sucesso no seu segundo mandato.
Cumpriu-se, mais uma vez o ritual democrático de alternância do poder, e quem participa do jogo eleitoral, sabe que tem pela frente duas únicas alternativas: ganhar ou perder.
Forças Armadas não podem ser usadas para um “terceiro turno”, com armas, ao invés de urnas.
No meio desses insensatos, ou tresloucados cidadãos, não se poderia admitir, ou compreender, a presença de um Magnífico Reitor. Ainda mais, sendo este Reitor o professor Jouberto Uchôa.
O conceito que ele desfruta, a importância da Universidade que ele construiu a partir de uma pequena escola; o exemplo da sua vida, começando a trabalhar como operário da Fábrica de Tecidos Sergipe Industrial, exercendo o oficio de tecelão, o único do sexo masculino numa atividade somente exercida por mulheres, e ele abriu caminho para as dezenas de homens que o imitaram; todas essas circunstâncias de uma vida na pobreza, e na carência de oportunidades, demonstram a tenacidade de Uchôa, para realizar o sonho que começou a acalentar ao tornar-se bedel no Colégio Tobias Barreto, e a entender o valor da educação para a sua própria vida, e para a sociedade de um modo geral.
Do curso primário da modestíssima Escola, surgiram o ginasial, o científico, e depois a primeira faculdade, chegando à portentosa Universidade Tiradentes, que ultrapassou as fronteiras de Sergipe, e hoje têm parcerias com universidades norte-americanas, expandindo suas ações ao exterior.
Sendo Reitor de uma grande Universidade, ele não pode dar demonstrações de aversão à civilidade, deixando-se contaminar por um vírus corrosivo que ameaçou, e ainda ameaça transformar o Brasil em cobaia para as experiências bizarras de um totalitarismo fanático, que transpõe as barreiras da civilidade, da lei, e mergulha no crime, quando propõe rasgar a nossa Constituição.
Contestar a alternância do poder, os modos civilizados de uma sociedade pacífica, democrática, pluralista e acolhedora, chega a ser ato solerte de lesa-pátria. Um homem que dissemina o Saber, uma professor, um Reitor, deve assumir compromissos: apologia à cultura, à tolerância, respeito às divergências, as raças, as religiões, enfim, aos valores de uma sociedade livre, e jamais confundir-se ou juntar-se aos bandos que buscam mergulhar o Brasil no caos da desordem, numa era cruel de ódios desatinados.
O que dirão os professores de Direito Constitucional da Universidade Tiradentes?
O que dirão os inúmeros professores doutores, que levam aos seus alunos a visão dos grandes filósofos, os exemplos de grandes personagens, o transcorrer da vida política no rumo do aperfeiçoamento daquele sistema, iniciado na pólis grega, e desde então, testado, aperfeiçoado, e as vezes pisoteado, para ressurgir sempre, porque, ainda não se encontrou nada de melhor que o substituísse: a democracia?
Uma Universidade com as dimensões da TIRADENTES, não deverá ser confundida com um “negócio familiar", uma simples fonte de lucros, muito menos, num instrumento de poder pessoal, manobrado ao talante dos seus controladores.
Pela UNIT passaram várias gerações de sergipanos, alagoanos, pernambucanos, baianos, gente de todo o país, agora, também de estrangeiros, e nela há de ser preservado um conjunto de valores, dos quais o Magnífico Reitor terá de ser um atento guardião.
Até mesmo do ponto de vista exclusivamente comercial, a adesão de Ucôha a um projeto insensato e bárbaro, intentado por meia dúzia de mentes doentias e frustradas, pode ser um risco de proporções imprevisíveis.
Os alunos, os professores, sentir-se-iam confortáveis numa sala de aula de uma Universidade, cujo Reitor houvesse participado de uma tentativa de impor, pela força das armas um regime de violência e opressão?
Em um Templo do Saber, não cabem essas excentricidades bizarras do apagar de luzes, no século vinte e um, trocando o Iluminismo pela escuridão da caverna. Aquela, onde Platão desenhou a alegoria da luz, num permanente duelo com as sombras.
O Reitor Uchôa deve uma explicação à sociedade sergipana, aos alunos e professores, que buscam sair das sombras e chegar à luz nos seus diversos campi, e não aceitarão que a Universidade onde estudam e se aperfeiçoam como cidadãos, deixe de ser um exemplo de clarificação, e afunde no obscurantismo.
A UNIT soltou uma nota simplória e anódina, afirmando que não tinha nada a comentar. Mas tem, e deve fazê-lo. Sob pena de uma cobrança permanente, porque, uma instituição do seu porte, da sua relevância, e com a sua história, não pode ser confundida com uma bodega de esquina, onde bêbados escarram no chão. A UNIT, repetimos, é um Templo do Saber, e os que o frequentam, esperam, ou exigem, que os seus "Sacerdotes", ofereçam os melhores exemplos de coerência, sensatez, equilíbrio, discernimento, tolerância, sapiência, enfim, que sejam, de fato, os “sacerdotes“ de um culto permanente à democracia e aos valores da civilização.
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COMUNICADO - UNIVERSIDADE TIRADENTES
A democracia é uma conquista da humanidade e um direito irrefutável de todos os cidadãos e cidadãs. Não acreditamos que seja possível construir um futuro sem liberdade de escolha. Somos um conjunto de bandeiras, de olhares, de sonhos. Somos portas para o amanhã e caminhos para o conhecimento.
Ciente do seu papel na vida cidadã da sociedade sergipana, a Universidade Tiradentes (Unit) vem elucidar que não se envolve institucionalmente em questões de cunho político-partidário, nem dá apoio a nenhum partido ou candidato, respeitando sempre a pluralidade de ideias.
Suas atividades ao longo de seus 60 anos sempre foram norteadas em princípios e valores institucionais, como humildade, cooperação e responsabilidade social.
A Unit entende que o respeito à democracia é fundamental na educação e na transformação da nossa sociedade.