Luiz Eduardo Costa
Luiz Eduardo Costa, é jornalista, escritor, ambientalista, membro da Academia Sergipana de Letras e da Academia Maçônica de Letras e Ciências.
ENTRE O PIB MURCHO E O “PRESIDENTE” FANTASIADO
06/03/2020
ENTRE O PIB MURCHO E O “PRESIDENTE” FANTASIADO

(O presidente e o humorista)

O dia 4 de março não teria sido, exatamente em nosso país, uma data a merecer comemorações, muito menos chacotas. Os nossos irmãos mineiros, fluminenses e capixabas, também paulistas, enfrentavam mais uma tragédia causada pelas chuvas habituais de verão, desta vez, porém, chegando com intensidade incomum.

Além disso, havia aquela tragédia já naturalizada do nosso dia a dia: violência, mortes no trânsito, enquanto chegavam os números dolorosos das mortes de centenas de brasileiros, vivendo em situação de extremo risco, à margem de rios ou pendurando suas casas em encostas escorregadias.

Por sinal o presidente até agora nem se moveu para ver de perto a calamidade, e levar alento e solidariedade a tantas famílias enlutadas.

Ao lado desse cenário doloroso, houve um sinal específico de mais desalento, surgido naquele 4 de março: era o PIB murcho sendo anunciado, chegando apenas a 1,1%. Talvez oitenta por cento dos brasileiros não saibam ou sequer deem importância àquela sigla de três letras um tanto indecifráveis, significando Produto Interno Bruto, nada esotérico, tudo muito real, traduzindo o fruto do trabalho dos brasileiros, que é precificado nos bens e serviços gerados no decorrer do ano.

Quando o presidente Bolsonaro assumiu, em meio aquele ôba ôba de otimismo e entusiasmo, imaginava-se, nos meios empresariais principalmente, que o Brasil rápido alcançaria um patamar de crescimento do PIB acima dos dois por cento. Afinal, viveríamos tempos de ultraliberalismo, com a retirada de obstáculos ao empreendedorismo, queda de juros, privatizações, reformas, e todos aqueles ingredientes indispensáveis, segundo imaginavam, ao dinamismo da economia. Depois, ligou-se a trajetória do PIB à aprovação da reforma da previdência. Se fosse feita, alardeou Paulo Guedes, logo romperíamos a barreira dos três por cento, deixando definitivamente para trás à irrelevância dos PIBs murchinhos. Definir exatamente porque não aconteceu aquela esperada maré montante de excelentes performances, exigiria uma longa e fastidiosa digressão. Mas é possível constatar a evidência de fatos que, fora do ambiente de negócios, afetam mais diretamente o ritmo em que rodam aquelas engrenagens complexas engordando ou emagrecendo o PIB de um país.

O PIB não está apenas ligado a fatores econômicos, ele depende, também, da firmeza e equilíbrio das instituições, do bom e normal andamento da política, em especial, das políticas públicas, o que pressupõe entrosamento entre os poderes, principalmente o desempenho eficaz de um deles, o Executivo.  Em situações de crise como a que vivemos, quando a economia em debacle nos levou ao fundo do poço, com desemprego alarmante, promover  a reativação do PIB é tarefa a ser executada por alguém que seja efetivamente um homem de Estado, um presidente dotado de visão política e administrativa, um homem preparado para o exercício do cargo.

Bolsonaro, ungido pelo voto e fortalecido pelo entusiasmado apoio de tantos milhões de   brasileiros, dos quais se fez depositário das esperanças, infelizmente, está muito distanciado do que se supõe, seja efetivamente um Estadista.

O capitão foi, segundo o ex-presidente general Geisel, um “péssimo militar”, e depois um deputado por vinte oito anos exercendo mandatos sem nada de relevante haver produzido, uma figura anódina, somente ganhando espaço na mídia pelas declarações extremadas que fazia.

Todavia, depois de eleito, o capitão teve o bom senso de ouvir um  núcleo de militares e técnicos, além de um ou dois amigos mais próximos, estes, dotados de bom senso, que influenciaram na formação da equipe. Retirando-se dela os malucos indicados por Olavo de Carvalho ou pelos seus filhos, são bem qualificados os demais. Em função desses, como por exemplo o general Santos Cruz, que foi deploravelmente vítima de uma sordidez, originária de alguns íntimos do presidente, o governo apresenta em algumas áreas aspectos bastante positivos. A política para o petróleo e gás   à qual Sergipe tempestivamente atrelou-se, e irá definir o nosso futuro, foi resultado de uma orientação segura do ministro das minas e energia Bento Albuquerque.

O que de pior poderá acontecer a um governo, é a persistência de um clima pesado de conflitos, até de odiosidades, gerando ideias e ações exóticas, ou flagrantemente contrarias ao que se acredita venha a ser a essência da civilização.

Desgraçadamente, para a sociedade brasileira, para o futuro do país, esse clima que poderia ser surreal, se não fosse tão densamente concreto, é criado e recriado de forma consciente pelo quadrunvirato da desorientada República, formado pelo presidente e os seus filhos, inspirados pelo desnaturado amoral Olavo de Carvalho.

Percorrendo a Amazônia, dialogando com os governadores, com os povos daquelas extensões ainda verdes, está o vice-presidente Hamilton Mourão. Indicado pelo presidente para presidir o Conselho da Amazônia, ele se dedica, agora, a formular sem desatinos ideológicos, um projeto de sobrevivência para a região, onde o desmatamento pelo fogo atingiu níveis alarmantes.

Ele procura corrigir, sem fazer alarde, erros crassos cometidos, e que levaram ao agravamento do desastre ambiental. Age da mesma maneira como já o fez em ocasiões anteriores, aliviando tensões com os árabes, com os chineses, que nos causariam gravíssimos e irreparáveis danos à balança comercial. Por atitudes como essas do general Mourão, é que o murchinho PIB de 1,1% ainda conseguiu ser alcançado.

Então, naquele dia 4 de março em que se revelou o PIB fraquejante, o presidente saiu mais uma vez dos trilhos daquilo que se convencionou denominar liturgia do cargo. Trata-se de um padrão de comportamento que pode a alguns parecer nada mais do que uma melosa formalidade. Mas não é. O presidente encarna a República, encarna a Nação, é o representante de todos nós brasileiros. Precisa conduzir-se à altura da posição onde se encontra.

Mas houve o pior. O presidente juntou-se a um humorista que lhe foi emprestado pela Rede Record, e o fez descer de um automóvel preto usando a faixa presidencial, e imitando os seus gestos.  Bolsonaro, ao lado, dava gargalhadas e mandava o palhaço substituí-lo na entrevista.

A cena percorreu o mundo.

Fica a pergunta: qual o grande grupo econômico qual o empresário que se moveria a investir num país onde o presidente patrocina uma cena assim, tão bizarra?

Na Ucrânia, enfrentando a ganancia imperialista da vizinha Rússia, sob o comando do guloso “Tzar” Vladimir Putin, foi eleito presidente um humorista, um palhaço mesmo, profissional. Parece que ele vai desempenhando a função de forma razoável. Entendeu que, para fazer graça, ou palhaçada, tem hora, lugar e circunstância.

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