Luiz Eduardo Costa
Luiz Eduardo Costa, é jornalista, escritor, ambientalista, membro da Academia Sergipana de Letras e da Academia Maçônica de Letras e Ciências.
COM 313 MIL VOTOS DE FRENTE O ¨GALEGUINHO¨ ENTRA EM CENA
01/11/2018
COM 313 MIL VOTOS DE FRENTE O ¨GALEGUINHO¨ ENTRA EM CENA


Belivaldo Chagas, um político discreto, que não parecia alimentar ambições de figurar no restrito time dos que podiam imaginar-se candidatos ao governo ou ao Senado, chegou ao governo quando, exercendo com eficiência e sem holofotes o papel de Vice Governador, houve a renúncia de Jackson Barreto. Já tinha sido antes, o vice do seu conterrâneo Marcelo Déda, que exercia o primeiro mandato.

Para candidatar-se ao segundo, Déda teve de trocar o vice por Jackson Barreto, um personagem político com muita capacidade de multiplicar votos. Belivaldo nem estrilou, e se manteve tranquilo e calmo no mesmo grupo. A hora de tornar-se outra vez vice lhe chegou, quando Jackson buscou a reeleição, e queria manter ao seu lado o grupo do senador Valadares, ao qual com toda lealdade Belivaldo pertencia.

Elegeram-se Jackson e ele, e na esteira de acontecimentos supervenientes, que marcariam o  açodado rompimento do grupo do senador com Jackson, Belivaldo, simplesmente,  anunciou que ficaria onde estava, lembrando até a Valadares que pelo confronto politico que existira entre o grupo ao qual pertencia com o grupo do senador Amorim, ao qual Valadares iria se juntar, o seu nome fora vetado para ocupar um cargo no Tribunal de Contas, isso, quando Edvan Amorim, irmão do senador, exercia quase  total comando sobre a Assembleia Legislativa.

Suas ponderações não foram levadas em conta pelo senador Valadares, que embarcara na onda a favor do impeachment da ¨antaológica¨ Dilma, (trocadilho infame) e já festejava uma aliança com os Amorim e André Moura, poderoso líder de Temer, que dariam suporte à candidatura de Valadares Filho a prefeito de Aracaju, a segunda,  depois da derrota anterior para João Alves. Tudo fracassou, mas o senador Valadares imaginou-se com força suficiente para desprezar o apoio dos antigos aliados, e contra todos eles investir, numa dupla candidatura majoritária, a dele mesmo à reeleição, e a do filho deputado federal candidato ao Governo.

O resultado foi aquele que se viu: a maior soma de votos já colocada pelo vencedor à frente do vencido, numa disputa pelo governo de Sergipe: 313 mil votos.

O autor da façanha, o modestíssimo e até menosprezado Belivaldo, cujas chances eram consideradas nulas no momento em que começou a exercer o governo.

Um integrante do staff do senador Valadares, até acidamente subestimava: ¨O erro de Belivaldo foi ter saído da cozinha de Valadares, agora, nem deputado estadual ele conseguira eleger-se¨.

O fenômeno tem causas, motivos e fatos que muito claramente o explicam.

Belivaldo é humilde, não se enfatuou no poder, permaneceu o que sempre foi. Dispensou as pompas, fechou o Palácio de Veraneio, que aliás é modestíssimo, mas fere a sensibilidade do povo imaginar que governante pode desfrutar de ¨veraneios¨.

Reduziu a quase nada a segurança pessoal, frequenta locais públicos sozinho, e chega, às vezes, dirigindo seu Fiat Mobi. Deu um sacolejo para mostrar que tinha estilo próprio de governar, demitiu secretario que se considerava poderoso e intocável, revelou personalidade, deu ênfase à segurança, melhorou a problemática rede estadual de saúde, cuidou de equilibrar as finanças, mostrou garra e sinalizou para mudanças, algumas até podendo parecer supérfluas, como a determinação que dará para que se torne homogênea a frota de automóveis do serviço público, riscando dele a presença dos carrões pretos, a ostentação descolada da nossa realidade, e fortalecendo a ideia, o conceito, o princípio basilar, de que servidor publico tem de ser fiel à frase que o qualifica, para não imaginar nunca o contrário, que é colocar a coisa pública  ao seu serviço.

Belivaldo tem a pesadíssima responsabilidade, a carga que doravante se faz cada dia mais pesada dessa cifra enorme dos 313 mil votos de diferença, o que o torna uma esperança, e ao mesmo tempo constrói a figura de um líder que  precisará inovar a cada dia, servir melhor ao povo, para que o papel que lhe foi dado não se venha a desfigurar.

ENTRE O DONALD TRUMP E O CAPITÃO BOLSONARO

Em qualquer país civilizado do mundo, com o histórico de atitudes e declarações como as que eram cotidianamente repetidas pelo capitão e deputado Jair Bolsonaro, ninguém seria em nenhuma hipótese eleito presidente da república pela via do voto direto e em um pleito absolutamente democrático.

Mas agora o capitão Jair Messias Bolsonaro é o presidente eleito da República Federativa do Brasil.

Metade do seu sucesso ele deve a ele mesmo, a outra metade lhe deram de presente.

O mesmo modelo adotado com êxito por Donald Trump, parece entusiasmar o nosso agora presidente. Nos Estados Unidos também ninguém acreditava que o bilionário falastrão e grosseiro, viesse a ocupar a Casa Branca.

Os americanos, apesar de terem alcançado um altíssimo padrão de vida, não conseguiram evoluir e chegar aos padrões civilizatórios alcançados por outros países, econômica e socialmente avançados.

A sociedade americana é complexa, conflituosa, e onde convivem fantásticos avanços ao lado de visões retrógradas e extremismos absurdos. Trump foi muito além da direita representada pelo conservadorismo do Partido Republicano, e tornou-se ídolo    dos supremacistas brancos que não envergonham-se de exibir suásticas, ou de desfilarem com as cruzes flamejantes dos assassinos militantes da Ku-Klux-Klan. Há ainda os desencantados com a política tradicional, e o poderoso complexo industrial muito aquém da pós-modernidade que se sente ameaçado, tanto pela globalização como pela consciência ecológica, apontando para novos paradigmas da convivência homem-natureza.

Trump pode desencadear uma guerra comercial com a China e com o mundo, o dólar é ainda a moeda soberana, seu país é, e será por muito tempo ainda a maior potência militar, e sua economia, mesmo se superada pela China nos próximos dez anos, ainda continuará dando as cartas no cenário global.

O Brasil não pode dar-se ao luxo de desprezar mercados de países que nos cercam, fazendo pouco caso do Mercosul, por considera-lo uma concertação meramente ideológica. Uma coisa é a destroçada e caloteira Venezuela, outra coisa a Argentina, também o Paraguai, o Uruguai.

O Brasil cometerá um erro fatal se atrelar-se à errática trajetória de Donald Trump, e aliar-se a ele na queda de braço com a China, pior ainda, se vierem a ter consequências no plano militar as sinalizações que teriam surgido na conversa mantida entre Trump e Bolsonaro.

Apenas como pontual exemplo: Se a Argentina fechar o seu mercado para os nossos produtos têxteis, em questão de meses estarão próximas da bancarrota diversas fábricas de tecidos brasileiras. Se a China restringir suas importações de soja, minério de ferro, uma parte considerável e dinâmica da economia brasileira entraria em colapso.

Não podemos ser dependentes de um só mercado, por isso temos de comercializar com o mundo, com a Venezuela, inclusive, desde que o execrável caloteiro Maduro nos pague adiantado.

Mas o super-ministro Paulo Guedes, demonstrando algum desequilíbrio emocional revela, raivoso, seu desprezo ao Mercosul, e desapreço aos BRICS, e diz que vai deter a desindustrialização do Brasil, ¨apesar dos industriais¨, aos quais classifica como atrasados e pendurados no protecionismo.

O penúltimo presidente do ciclo de poder militar que foi o general Ernesto Geisel,  ousou fazer um acordo nuclear com a Alemanha, foi sabotado por Washington, e corajosamente  rompeu o acordo  militar Brasil-Estados Unidos, por via do qual nossas  forças armadas não acionavam os motores de um submarino, de um caça ou de um tanque sem  que o Pentágono, antes, tomasse nota e monitorasse os movimentos.

Não precisamos nos distanciar dos Estados Unidos, devemos estreitar laços em vários campos, no comércio, principalmente. Na cooperação cientifica, em parcerias econômicas, mas sem irmos a reboque das suas visões geopolíticas, que são exclusivistas, e agora indo aos extremos com o brado ultranacionalista de Trump:  ¨América First¨.

Relações internacionais não são construídas a partir das preferências de cada governante, elas são parte dos objetivos nacionais permanentes, e o Brasil tem a sua diplomacia mantida em alto conceito internacional.

Para fazer um agradinho  a Trump não podemos sequer imaginar em transferir a nossa Embaixada de Tel Aviv para Jerusalém, a cidade sagrada de três grandes eixos religiosos, entre os quais o judaísmo é uma parte ínfima, são cerca de 20 milhões de seguidores, enquanto o islamismo  chega a um bilhão, e o cristianismo vai a  mais do que isso.

Essa transferência que Bolsonaro como candidato anunciou, e que Trump já fez, além de um outro país sem nenhuma expressão, seria catastrófica para o Brasil. Temos excelentes relações com o mundo islâmico , da mesma forma com Israel, mas, sem as  exportações que fazemos para os  árabes, nossa indústria de alimentos desaba, além de outras consequências mais graves, inclusive o rompimento de uma tradição de tolerância e amizade com todos os povos . Aqui, vivem comunidades árabes que se relacionam muito bem com os judeus, não há conflitos. Iremos fazer com que eles surjam?

Imitando a insensatez de Trump, que pode ser grotescamente estupido por ter a força, nós, que somos fortes graças ao respeito que temos na comunidade global, perderemos a autoridade ética de um país pacificador, e mergulharemos, de cabeça,  no fundo seco de um conflito no qual sempre exercemos o papel nobre da mediação.

Bolsonaro já está sendo chamado de Trump Tropical, antes de envaidecer-se, ele deveria enxergar isso como um insulto.

Acabou a polarização do mundo, sumiu, com o desabar do Muro de Berlim aquele sentimento que unia o chamado ¨mundo livre¨ contra a ameaça comunista, que efetivamente se corporificava, na ideologia, e na atávica sede expansionista que sempre moveu o império russo, transfigurado com  o nome de União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, a URSS. Em cena entrava também o poderio da China Vermelha, e isso quase impunha alinhamentos ao Brasil, aos quais nunca mantivemos plena devoção, tanto, que nos recusamos a mandar tropas para a carnificina da Coreia no começo da década dos anos cinquenta; depois, mesmo no período dos governos militares, driblamos as insinuações para que nos envolvêssemos no matadouro inútil do Vietnam.

Se Trump por lá grita: América First, a ele devemos imitar, mas dizendo sem gritos: Brasil Primeiro.

 

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