Luiz Eduardo Costa
Luiz Eduardo Costa, é jornalista, escritor, ambientalista, membro da Academia Sergipana de Letras e da Academia Maçônica de Letras e Ciências.
BRASIL, DE GETÚLIO A JAIR BOLSONARO
07/12/2018
BRASIL, DE GETÚLIO A JAIR BOLSONARO

Houve no Brasil 3 presidentes que ousaram montar um projeto de país lastreado em objetivos nacionais permanentes. Seus nomes: Getúlio Vargas, Juscelino Kubitschek e Ernesto Geisel.

Lula e Fernando Henrique poderiam estar entre eles.

O primeiro reviveu a esquecida realidade de que havia milhões de brasileiros passando fome. Foi buscar uma ideia já em execução no governo passado, deu-lhe maior conteúdo e abrangência, e dele fez o carro-chefe de uma ambição virtuosa, que seria um país onde o direito fundamental à sobrevivência estaria assegurado.

Lula, contudo, não foi ao ponto fundamental, que continua sendo a extrema dependência da nossa economia aos fatores externos. Armou a sua rede de nordestino vencedor em dois cabides, um, em São Bernardo do Campo, outro, na Avenida Paulista, no endereço da FEBRABAN.

Num dos cabides, a companheirada em festa começou a labuzar-se com mel, e adorou o gosto, compartilhando com novos aliados há muito lambuzados. No outro cabide os donos do cassino financeiro continuaram a fazer as mesmas apostas. Nenhum dos pendurados nos dois cabides apostou seriamente no Brasil.

FHC cometeu o erro de imaginar que o Plano Real seria a base para uma economia sólida, atrelando a moeda sem lastro ao suposto amparo do dólar. A crise de 1999 o fez sair, mal arriara as malas, da casa na Praia do Saco, do governador e anfitrião Albano Franco, onde iria descansar por 4 dias.

Retornou à Brasilia, depois foi a Washington abrigar-se sob a condescendência do amigo Bill Clinton, que orientou o FMI para nos socorrer na emergência. FHC constatava: país periférico, no modelo atual, não pode alimentar a ilusão de ter moeda forte.

Um fato a ser observado nos governos de Getúlio, JK e Geisel: Todos tentaram quebrar o alinhamento automático que mantínhamos com os Estados Unidos, em face da polarização entre capitalismo e comunismo.

Getúlio, produto da década dos anos 30, não revelava gosto pela política externa. Homem da fronteira, tinha a característica atávica dos que vivem olhando para o outro lado como terreno inimigo. Mas, teve em Osvaldo Aranha um chanceler brilhante, e no tenente João Alberto a ousadia do revolucionário indo além da morosidade diplomática.

Getúlio era pragmático, tirou proveito comercial do confronto entre as democracias e o Nazifascismo. Fez quase juras de amor ao totalitarismo hitlerista, que acabara de subjugar a França, mas, comprava a bom preço os nossos produtos primários. Todavia, correu a dar solidariedade aos Estados Unidos, rompendo com o Eixo, (Alemanha-Japão-Itália) quando houve o ataque à base de Peral Harbor.

Manhosamente, resistiu enquanto pode para atender aos americanos que queriam montar no nordeste a base para a invasão da África do Norte. Cedeu depois, mandou até um numeroso contingente de tropas para lutar, aliás bravamente, na Itália, uma aventura inimaginável para um país como o Brasil, atrasado, pobre, destituído de recursos bélicos. Assim, seduziu Roosevelt, que lhe abriu as portas a créditos, e forneceu-lhe tecnologia para a montagem da Siderúrgica de Volta Redonda.

Getúlio botou no papel tudo o que restava para fazer a independência econômica do Brasil. Deposto, Dutra, que o sucedeu, gastou os créditos que acumuláramos durante a guerra abrindo o mercado para a invasão de quinquilharias americanas.

Retornando pelo voto em 1950, Getúlio prosseguiu no seu intento, criou a PETROBRAS, e o que aconteceu é bem-sabido. Está explicitado na Carta-Testamento.

JK chegou com gosto de gás. Buscou investimentos na Europa, no Japão, fez política externa inovadora, mas aquietou a ¨fera¨, o nosso ¨irmão do norte¨. Levou a Washington a base de uma política para a cooperação, uma espécie de Plano Marshall na América Latina. A ideia surgiu da cabeça prolífica do grande amigo de JK, o poeta e vendedor de secos e molhados, dono da rede de Supermercados Disco. Um autodidata genial, Augusto Frederico Schmidt, tinha cultura e visão de mundo. O presidente Kennedy encantou-se com a ideia, e a transformou na Aliança Para o Progresso. Assim, Juscelino pôde romper com o FMI, fazer Brasília desafiando todo o carrancismo da elite embolorada; derrotou duas rebeliões militares, e teve, no dia da Inauguração da Nova Capital, a presença dos ¨grandes ¨do mundo, encantados com o Brasil, a Nação tropical um tanto exótica, que vencia a pasmaceira do atraso e surgia com ares de primeira potência abaixo da linha do Equador.

O general Geisel, homem rigoroso, militar no modelo quase prussiano, sucedeu a três generais sem vocação para estadistas, e a uma Junta Militar, formada no tumulto improvisado de um tempo de excessos autoritários, e chegou prometendo a distensão: ¨lenta, gradual e segura¨.

Fez mais do que isso, e montou um projeto autônomo de desenvolvimento para o Brasil, sem a supervisão direta de ninguém. Abriu Embaixada em Pequim, deu ao empresário brasileiro a possibilidade de alcançar o que breve seria o maior mercado do mundo. Rompeu o humilhante acordo militar com os Estados Unidos, foi à Alemanha e assinou um acordo nuclear, até hoje sabotado.

Quando a crise do petróleo nos devastava Geisel criou o Proálcool, o mais ambicioso programa de aproveitamento de energia da biomassa do mundo. Foi buscar um engenheiro visionário, Bautista Vidal, e ele fez o projeto que em menos de dois anos transformou o etanol num sucedâneo melhor do que o petróleo.

Bolsonaro, o presidente eleito, reúne uma extensa e diversificada base de apoio que nenhum dos três precursores de um caminho de autonomia tiveram.

Se ele quiser passar a História como o quarto grande presidente poderá inspirar-se nos outros três, o que o deixaria longe do Chicago Boy, e do diplomata que o próprio Itamaraty detesta.

¨A Escola de Chicago que mais mortes causou não foi a de Al Capone¨.

A frase é do empresário Severo Gomes, ex-ministro de Geisel, que morreu junto com Ulisses Guimarães no acidente do helicóptero.

¨Eles é que precisam de nós e não o contrário¨.

A frase é do general Andrade Serpa, um cara repleto de brasilidade, advertindo para os perigos de uma política externa e de uma economia descolada dos nossos interesses.


 


 

Voltar