AS URNAS O “FENÔMENO” E UMA VOLTA DE 360 GRAUS
Mudam os figurantes mas o "reizado" é o mesmo.
As ciências da natureza, ou as que se denominam exatas, são aquelas que tornam possível o avanço da técnica colocada a serviço da humanidade. Com a utilização dos conhecimentos científicos, a matemática sempre à frente, tornou-se possível prever os eventos, ou cataclismos, tais como devastadores furacões, secas alongadas, enchentes arrasadoras, os extremos do frio, do calor. Só os terremotos continuam, até agora, fora da capacidade humana para “agenda-los” com antecedência, tal como se faz com os furacões, que, antes de surgirem, furiosos, já receberam a grife , o substantivo feminino ou masculino pelo qual passam a ser chamados, e depois relembrados, na razão direta da intensidade dos estragos que causam.
Já as ciências humanas, assim chamadas, por tratarem das sociedades, das suas reações, angústias, esperanças ou odiosidades; alegrias ou tristezas, simpatias, ou aversões, registradas no dia a dia de cada ser humano, transformadas no sentir coletivo, ou naquilo que, na década dos trinta, Ortega e Gasset definiu como a “rebelião das massas “. Os reflexos de tudo isso, que, por sua vez, o jesuíta teólogo e cientista Teillhard de Chardin conceituou como Fenômeno Humano, ocorrendo nas cidades e aldeias, no campo ou no chão das fábricas, nas salas de aula, e celas das prisões, ou seja, naquele universo complexo que o homo sapiens, por ser inteligente criou, para nele viver, em paz ou em guerra.
Para abarcarem esse universo de pessoas e coisas, as chamadas ciências humanas necessitam de uma variedade complexa de conhecimentos específicos. E surgiram os ramos, entre outros, das ciências políticas, e, por via de consequência, os “cientistas políticos”. Eles, tanto podem ser simples palpiteiros, ou cuidadosos analistas munidos de farto conhecimento.
Há certas circunstâncias na política, como, por exemplo, um clima escancaradamente adverso, que a voz pública traduz, nas quais nem é preciso recorrer aos sapientes oráculos, para que se tenha o desenho exato do que é a realidade a ser enfrentada numa campanha eleitoral.
Formou-se, em Aracaju, nesta eleição para Prefeito o maior grupamento de lideranças jamais ocorrido na história da capital, ou mesmo no estado. Compunham o grupo, o governador Mitidieri, o Prefeito da Capital Edvaldo Nogueira, (este, confiante nos êxitos reais alcançados nas suas administrações) e mais três senadores da República, indo do bolsonarismo ao petismo; a reboque, vinham dois ex-governadores, um deles Jackson Barreto, que também foi Prefeito de Aracaju, e com maior avaliação positiva até hoje. Secundavam ainda o conglomerado difuso, o presidente da Câmara de Vereadores de Aracaju, e vereador mais votado, e todos os candidatos e candidatas que não passaram do primeiro turno, (menos a deputada federal Yandra), desde a delegada Daniele, (que viu derreter seus votos após deixar de ser oposição) e mais uma soma vistosa de vereadores, lideranças comunitárias, pastores de almas e de rebanhos, supostamente dóceis. Havia, ainda, a delegada deputada federal Katarina, que se supunha ter força e votos na periferia. E, a tudo isso, somam-se mais uma legião de aderentes de todas as origens e matizes, e as máquinas do estado e prefeitura rodando a todo vapor.
Mas, havia os irreparáveis erros cometidos lá longe, desde que começou o truncado debate sobre a eleição em Aracaju, onde as vaidades e presunções, predominaram, emparedando a razão.
E aconteceu a derrota acachapante.
Emília, a vencedora, como entende uma enorme parcela dos seus eleitores, é uma política, capaz de desmanchar o “sistemão”, e iniciar um novo tempo.
O que foi derrotado agora não é um “sistema”, algo vazio, sem definição precisa, tal como apelidam ao grupo opositor, os assanhados integrantes da ala bolsonarista radicalizada, que, aliás, foi pesadamente derrotada agora, e deixando o ex-presidente numa posição secundária, da qual não conseguirá escapar.
Em Aracaju, foi derrotado apenas um modelo de governança que cansou. Se for entendida por “sistemão” a estrutura política existente em Sergipe, Emília, estaria a ela umbilicalmente ligada, e o seu cordão umbilical chama-se Edvan Amorim.
Luiz Roberto, o derrotado, tentou minimizar o episódio que está a merecer uma reflexão profunda, uma atitude humilde daqueles que o fizeram percorrer uma pista de obstáculos, onde, nas atuais circunstâncias, qualquer outro tropeçaria.
Luiz é um experiente e respeitado advogado e gestor público, todavia, ainda um ingênuo, quase uma freirinha recatada no “cabaré” da política, que não vem a ser, como alguns simplórios ou radicais extremados imaginam, um antro de prostituições morais, mas é, de fato, sem metáforas, uma espécie de palco, complexo, onde seus atores interpretam papeis diversos, movimentando--se entre a devassidão e a virtude; entre o interesse público e os próprios egos ambiciosos. Nesse cenário, posicionando-se sob os holofotes cada vez mais exigentes de uma plateia enfastiada, os “showmens” degradam, ou emolduram, o papel que representam. Os espectadores, de dois em dois anos, se declaram satisfeitos ou revoltados com as interpretações, sem palmas ou apupos, apenas, pelo voto, que sintetiza os dois sentimentos.
No palco atual da política, onde entram todos os intrusos por via Internet, a arte de interpretar reveste-se do seu melhor sentido, que é traduzir emoções, entender sentimentos, decifrar as faces, e através de ações, onde as obras públicas se tornam um adjunto da capacidade de traduzir e expressar.
No “teatro” da política atual, brasileira, sergipana, não se tolera mais aquela arte teatral antiga dos japoneses, onde, para dar ênfase às histórias e aos personagens que encarnavam, os atores, no palco, usavam máscaras. Do milenar Japão, aquelas máscaras seriam hoje entendidas como uma forma de marketing.
No caso específico, sergipaníssimo, os “atores” terão de mudar de palco, “descerem dos trios elétricos”, entenderem que é preciso fazer uma trigonométrica volta de trezentos e sessenta graus, ou seja, retornarem ao ponto de onde começaram. O recomeço pela realidade. O governador Fábio Mitidieri como primeiro da fila. Um ato que exigirá dele, espírito público, sensatez lúcida, e decisão política.
Para o Prefeito Edvaldo, não haverá mais tempo. Mas, o que ele fez de bom, e não foi pouco, será lembrado.