“Hibernar” foi o eufemismo ou empolado engodo para dar um nome com certa elegância à calamidade que queriam cometer: o sucateamento de uma grande e estratégica indústria, a fábrica de fertilizantes nitrogenados, a sergipana FAFEN. A PETROBRAS, em pleno delírio rentista da agiotagem desenfreada posta em prática por Pedro Parente, aumentava o preço dos combustíveis quase todo dia, e os reduzia de vez em quando. Era a entrada em vigor da escorchante política de recuperação da estatal brasileira para satisfazer os grandes acionistas, e sugando o que restava da capacidade aquisitiva da sociedade, numa economia em recessão. Festejavam os rentistas, estrangeiros principalmente, festejava o governo, ou camarilha, o sucesso na “recuperação” da estatal combalida por um acumulo de erros e crimes, quando, numa mazorca cívico-anarquista, os caminhoneiros “tocaram fogo no circo”.
Antes da rebelião, já estava decretada a “hibernação” das FAFENs, a sergipana e a baiana.
Hiberna um bicho, o urso, por exemplo, quando desativa seu mecanismo fisiológico e entra em sono profundo, apenas, mantendo o essencial para a vida, e acorda, quando a primeira claridade do sol primaveril chega à quietude quase sepulcral da sua toca, e ele reativa-se, volta à vida normal, com a fome de um jejuar alongado.
“Hibernar” uma indústria, em torno da qual gravitam dezenas de outras, e muitas e variadas atividades, é um golpe de quase morte, aplicado, no caso da FAFEN sergipana, a um contingente humano em torno de 10 mil dependentes diretos e indiretos do seu funcionamento.
Com a FAFEN paralisada, “hibernando”, altera-se todo o sistema de fornecimento de insumos para uma cadeia produtiva de fertilizantes, sem a qual será afetado também o agronegócio, a agricultura familiar, exatamente aqueles que garantem o suprimento de comida.
Para o fim dessa “hibernação” da FAFEN, nem haveria a esperança de um sol de primavera, como no caso do nosso supracitado urso.
Por que então “hibernar”, se existia a possibilidade de vender ou arrendar a empresa?
Naquela época, a direção da PETROBRAS sem nenhum constrangimento, apenas alegou que fabricar fertilizante era um ramo de negócio que não mais interessava à empresa. Depois de muitas idas e vindas, sobretudo, o argumento de que em final de governo não se deveria adotar uma atitude tão drástica e carregada de suspeições, finalmente foi decidido que a fábrica permaneceria operando, mas, o prazo final para a “hibernação” apenas era transferido para 31 de janeiro de 2019, ou seja: agora, daqui a poucos dias.
A nova direção da PETROBRAS apressou o processo para a privatização da empresa, adotando-se a solução da “meia sola” que poderá até ser mais viável: o arrendamento. Para isso já foi publicado o edital, e os prazos começam a correr. Difícil acreditar que antes deste fim de mês a maratona burocrática já tenha sido completada, e surgindo como se fosse uma espécie de fugaz e antecipada primavera, aparecesse algum empresário interessado em assumir a estatal condenada.
A questão, agora, seria conseguir da direção da PETROBRAS, ou do próprio presidente Bolsonaro uma suspensão do prazo, para que a fábrica permaneça em funcionamento até que o negócio da transferência de gestores seja efetuado.
A paralisação pura e simples, como está prevista, seria danosa, como adverte o secretário de Economia Ciência e Tecnologia de Sergipe, o engenheiro e professor da UFERJ Jose Augusto. Ele detalha os efeitos negativos, desde a própria manutenção da empresa parada por tempo indefinido, e desenha um terremoto de incertezas no polo de fertilizantes, que teria de importar os insumos, e o tumulto da imprevisibilidade nas planilhas de custos. Ou seja, o mercado nele incluindo-se produção e força de trabalho será profundamente afetado, e resultará desorganizado todo o sistema. A “hibernação” seria uma pré-fabricada entropia, para ninguém botar defeito, com todas as consequências nefastas para uma economia nacional que apenas dá sinais de lenta recuperação, e, no caso sergipano, pior ainda. Equivaleria a um tsunami de proporções catastróficas.
Resta-nos a esperança de que após corridas à Brasília, a racionalidade prevaleça, e a FAFEN permaneça em atividade normal, até que a bandeira de um novo dono seja colocada no mastro da estatal iniciada pelo presidente-general Ernesto Geisel, após estudos que lhe foram levados pelo governo de Sergipe, e inaugurada no governo do presidente-general João Figueiredo.
Eles a enxergavam como estratégica para o Brasil, e continua sendo, a não ser que uma nova visão ultraliberal tenha desconstruído todos os argumentos a favor da ideia de soberania e independência econômica do Brasil, e assim, condenando a FAFEN a uma fatal extinção, para que nos invadam completamente os fertilizantes importados, e se amplie a nossa dependência externa.
Se é isso o que desejam, então, “hibernar” a FAFEN tem lógica. Embora perversa.