Luiz Eduardo Costa
Luiz Eduardo Costa, é jornalista, escritor, ambientalista, membro da Academia Sergipana de Letras e da Academia Maçônica de Letras e Ciências.
Os nossos sepulcros caiados
21/10/2017
Os nossos sepulcros caiados

Nós, brasileiros, estamos hoje a cumprir a ingrata tarefa de caiar sepulcros. Presume, quem vota, que o candidato seja pelo menos obediente a algum desses princípios básicos, elementares, que constituem os chamados bons costumes, adotados por toda sociedade que se defina como civilizada. Evoluímos muito no que diz respeito à mecânica do voto, que não enfiamos mais na urna, chamada indevassável, mas nunca conseguiu fazer jus ao nome indevido que nela botaram.

Votamos, hoje, a olhar o rosto daquele que escolhemos. Dizem que isso faz crescer ainda mais o privilégio democrático de votar e ser votado. Esse olhar final, cara a cara de quem vota ou recebe o voto, seria a forma ainda mais efetiva de selar um compromisso indispensável entre as duas partes. Esse sistema eletrônico transforma-se, agora, numa espécie de metáfora da farsa democrática que vivemos. O eleitor supõe que enxergando a cara colorida e maquiada do candidato, melhor o conhece, o identifica, e assim não comete equivoco, não erra o voto, por troca ou falsa avaliação.

O criminologista, psiquiatra e antropólogo italiano Lombrosso, homem do século 19, -morreu no começo do século 20- criou uma teoria que influenciou a academia e também os ideólogos racistas do nazi-fascismo. Segundo Lombrosso, podem ser identificáveis na face de cada um as propensões diversas ao crime, com os estudos de frenologia referentes à conformação do crânio e capacidade mental, chegou-se à ridícula concepção de que, tanto o facínora, como as ¨raças inferiores¨, poderiam  ser da mesma forma identificados.

O filósofo Sócrates nada escreveu, mas deixou à posteridade o que pensava através de dois discípulos, um, filósofo como ele, Platão, outro, mais famoso como general, Xenofonte. Sócrates, preocupado sobretudo com a moral,  garimpava os veios um tanto ocultos do que é bom, justo, verdadeiro, e considerava a educação a mola mestra do equilíbrio social. Teria dito Sócrates: “A educação é tão poderosa que é capaz até de corrigir a feiura, porque risca na face as linhas do espírito”.

Lombrosso e Sócrates não viveram para verificar o que os cosméticos e a arte da maquiagem podem fazer hoje em rostos plastificados, frios, que ocultam o cinismo, e neles não se consegue identificar nenhum traço de espírito deixado pela educação que receberam.

Quem olhar a cara de Temer, Aécio, Gilmar Mendes, Dória, suspeitará do que estamos  falando.

Infelizmente, para o povo brasileiro, sobrevivem e se fortalecem cada vez mais os Sepulcros Caiados, e somos nós os eleitores que os caiamos, para que fiquem branquinhos, assépticos, o mau cheiro contido, tudo sob o abrigo da cal protetora que sobre eles ingênua ou coniventemente derramamos: o nosso voto. Conferimos a legitimidade que eles usam para se tornarem meliantes inalcançáveis pela Justiça, impunes.

Os Sepulcros Caiados são antigos remanescentes longevos da rançosa Confraria do Peculato, que sempre invadiu a política. Acontece que hoje, ¨tá tudo dominado¨, eles ocuparam as instituições, formaram o Primeiro Comando do Planalto, a organização criminosa que, segundo o deputado mineiro major Olímpio, é agora muito mais perigosa do que o PCC (Primeiro Comando da Capital), criado  por bandidos que estavam presos no Carandirú. Já o PCP organizou-se e se mantem forte e inatingível, transitando pelos poderes da República.

Surge a constrangedora constatação de que apenas pela via política não se conseguirá mais deter a marcha avassaladora do Primeiro Comando do Planalto. Ninguém de bom senso imaginaria uma saída pela força, que traria incalculáveis consequências.

O Supremo poderia ter sido o remédio próprio para a contenção, embora não ortodoxa, desse carcinoma moral, antes que ele se transforme em metástase, alcançando todo o vulnerável corpo da Nação. Mas o próprio STF estaria precisando de uma forte e rigorosa quimioterapia.

Temer terá de ser levado a renuncia. Isso poderia acontecer de forma não traumática, sem alterar o rito constitucional.

Bastaria os chefes militares, numa audiência privada, informarem o presidente que ele perdera as condições morais para continuar à frente da Chefia da Nação, e exercer o supremo comando das forças armadas. Por isso, deveria renunciar.

O presidente da Câmara assumiria o governo, se cumpriria o que está escrito na Carta, os Sepulcros Caiados iniciariam a retirada, e 95% dos brasileiros bateriam palmas.

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UM DIA DISSERAM BASTA

Agora, acontece a desmoralização de tudo. A falta de respeito à Nação, às leis, chegou ao limite. Temer, acusado de chefiar uma organização criminosa, distribui dinheiro público, como se fosse farinha, fazendo negócios para segurar-se no Poder, usado como instrumento pessoal, à sua disposição, para salvar-se de um julgamento, e provavelmente da cadeia, onde já estão seus ex-ministros e assessores. Isso chamava-se obstrução de justiça.

Jucá, sempre ele, acusado, investigado em mais de dez inquéritos no STF, assumiu a chefia das tenebrosas transações. Oito ministros foram exonerados para reassumirem seus mandatos na Câmara e votarem a favor, além de apresentarem emendas de milhões de reais. Interrompe-se o fluxo normal da máquina administrativa, já tão emperrada e ineficiente, com essa rotatividade de ministros. Esqueceram-se completamente do Brasil, dos brasileiros, tratam exclusivamente da própria salvação. Fazem da máquina pública um brinquedinho doméstico.

Nos idos de março de 1964, um jornal respeitável, o Correio da Manhã publicou um editorial de primeira página com titulo em letras enormes: BASTA.

Dois dias depois, caíamos numa ditadura. Diziam que o governo estava contaminado por subversivos e corruptos. Sobre subversão a coisa tornou-se polêmica, já sobre corrupção, constatou-se, depois de tantos inquéritos, que o nível era baixo, e o presidente deposto João Goulart nela não tinha envolvimento. Não era um Sepulcro Caiado, ou seja, um ladrão, disfarçando-se como político, e amparando-se no cargo que exerce.

Se Jango, Juscelino e tantos políticos daquele tempo houvessem cometido um centésimo que fosse do que hoje faz a ¨Organização Criminosa no Poder¨, por certo teriam sido fuzilados.

DO BAILARINO NEGRO AO PERDÃO QUE NÃO PEDIMOS

Na sessão de segunda- feira, 16, o presidente da Academia Sergipana de Letras, José Anderson Nascimento convidou o bailarino negro Senzala para falar sobre suas experiências pessoais, em relação ao racismo e outros preconceitos. Senzala, idoso, não mais dança, mas coreografa espetáculos, permanece ligado ao balé, depois de ter frequentado palcos de famosos teatros internacionais.

A sala de reuniões da Academia, estava naquela tarde repleta, com a presença de acadêmicos e integrantes do MAC, Movimento Cultural Antônio Garcia Filho, um apêndice da Academia, quase um pré-vestibular de ingresso  àquela ¨imortalidade¨ a prazo fixo.

Senzala divagou em tantas coisas, mas, fez uma afirmação que sintetizou a vastidão do preconceito racial. Disse Senzala aos ouvintes brancos: ¨Querem comprovar o tamanho do preconceito, pintem-se de preto e passem o dia percorrendo a cidade, nas ruas, nos bares, nos restaurantes, nos Shoppings, nos órgãos públicos¨.

Num país assim, onde remanesce em tantos setores aquele inconformismo, agora de cento e vinte nove anos com a Lei Áurea, compreende-se muito bem o que quis dizer o bailarino Senzala.

Este cambaleante governo de Temer, tão retrógrado, tão insensível, tão desregradamente corrupto, tão criminosamente lesa-pátria, adere agora aos que têm saudade do regime escravocrata, e a eles presenteia uma portaria ministerial que extingue praticamente toda espécie de obstáculo à desumanidade do trabalho escravo.

Perante o mundo civilizado passamos um recibo de incivilidade. O trabalho escravo existe, sem duvidas, em fazendas geralmente de grileiros, pelo interior de tantos estados, mais intensamente no Pará, Maranhão, Mato Grosso, mas, às vezes, está bem perto de nós, dentro das cidades.

Em São Paulo a fiscalização detectou trabalho escravo a que estão submetidos imigrantes haitianos, bolivianos, coreanos, angolanos e até nordestinos, daqui mesmo. Houve flagrantes por causa da fiscalização ativa. Sem ela, a prática comum de recrutar trabalhadores, dar comida podre em vez de salário, e manter a todos confinados em galpões insalubres, nojentos, na condição de escravos, vai se ampliar e tornar-se até um habito entendido como normal.

Mantida a Portaria, voltaremos praticamente à escravatura, que já foi defendida indiretamente, pasmem, por um Ministro da nossa Suprema Corte, o inefável Gilmar Mendes, também pelo Ministro da Agricultura Blairo Maggi, grande produtor de soja , que disse estar defendendo o agronegócio. Assim, estaria jogando os empresários que tocam o mais dinâmico ramo da economia brasileira na vala comum daqueles que recorrem ao trabalho escravo, o que é uma injustiça.

A CNI alinhou-se também ao retrocesso, quando poderia ter apresentado uma sugestão ao diálogo, à análise por exemplo, de balizamentos para a fiscalização, porque em certos casos existem a distorções. A CNI deveria saber que se regredirmos no combate ao trabalho escravo, nossos produtos de exportação irão ser objeto de restrições no mercado internacional.

A Organização Internacional do Trabalho, OIT, já sinalizou o repúdio à Portaria indigna, e o mesmo fez a Procuradora Geral da República Raquel Dodge. A ONU também juntou-se à indignação mundial. Estamos na contramão da História e apartados do mundo civilizado.

Temer rasga a Lei Aurea, ofende a dignidade da Nação para acariciar a chamada bancada ruralista, onde, aliás, há alguns deputados que não votam nele e também condenam a celerada Portaria.

O tão inconformado quanto corajoso lutador pelo fim do regime escravocrata, o advogado e jornalista paulista Antônio Silva Jardim, que organizava grupos para libertarem escravos nas senzalas, disse que a lei da abolição poderia resumir-se em dois simples artigos, assim: ¨1º) Fica abolida a escravidão no Brasil. 2º) pedimos perdão ao mundo por não tê-lo feito há mais tempo¨.

Silva Jardim propôs ao movimento republicano uma ação armada para derrubar o imperador Pedro II.

Decepcionado, deixou o Brasil, foi viver na Europa. Subindo as vertentes do vulcão Vesúvio na Itália, despencou num abismo. O abolicionista e monarquista Jose do Patrocínio, desafeto de Silva Jardim, lhe fez um elogio, ou gozação fúnebre: ¨Bela sepultura o vulcão. O grande brasileiro morreu, e transformou-se em lava.

A CIDADE AS ÁRVORES E OS PASSARINHOS CANTANDO

 Na ¨pauliceia desvairada¨ de Oswald de Andrade, ou  nas selvas de pedra como são classificadas todas as megalópoles, é possível ouvir-se o som, por vezes mavioso de pássaros melodiosos, ou o rascante crocitar de corvos, o  coro enjoativo dos pardais, e  tantos outros.

Seriam os remanescentes da natureza sufocada, que se fazem porta-vozes de um apelo à consciência dos humanos, tão indiferentes a tudo o que não seja consumo, fruição, e a necessidade de atender esses novos imperativos da pós-modernidade. Ela existiria mesmo?

As cidades podem acolher os pássaros. Dalgas Frisch que dedicou a vida a eles, levou São Paulo a iniciar essa ação de acolhimento. Classificou árvores das mais diversas dimensões que oferecem alimento às aves, e incentivou o plantio delas, nas praças, nas ruas paulistanas, e isso aconteceu também nas varandas, nas coberturas dos prédios.

As pessoas que transitam naquela azáfama da Avenida Paulista, quase nunca observam um espaço murado próximo ao Museu de Arte Moderna, no lado oposto, junto à alameda Santos. Chama-se Parque Siqueira Campos, o heroico tenente de todas as rebeldias dos anos vinte.  Parece um milagre, um refúgio do verde, onde pássaros cantam e onde alguma calma substitui a desordem de fumaça e barulho da grande cidade.

Cada cidade tem aves que nelas melhor se adaptam. Em Brasília, as maritacas, um tipo de ararinha, no por do sol da capital que se mistura com o horizonte, em bandos, se recolhem ao topo das árvores, e começam uma sinfonia de trinados múltiplos, cujo ritmo se aquieta, na melancolia do dia findando, enquanto as sombras se ampliam.

Em Aracaju tínhamos o espetáculo das garças que voejavam sobre o manguezal da 13 de Julho. Chegavam por volta das cinco, voavam, acompanhadas quase sempre de outras aves que se juntavam ao bando, inclusive gaviões, e iam todos acomodarem-se nas copas das gaiteiras. Era um belo espetáculo vespertino que agora perdeu-se.

Aracaju tem feito muito pela arborização, isso começou muito fortemente com João Alves, quando pela primeira vez prefeito, depois, sucedido por Heráclito Rolemberg, que enfrentou interesses imobiliários e manteve a área verde da Sementeira, transformada no Parque Augusto Franco.

Jackson plantou muitos coqueiros, Almeida Lima plantou cajueiros e ipês.  Depois, com Déda e Edvaldo, a Sementeira aumentou a área arborizada, da mesma forma, aconteceu pelas ruas a onda das craibeiras, ofertadas pelo Instituto Vida Ativa. Edvaldo gosta de plantar, e tem plantado, poderia agora ampliar as ações, dando especial destaque às plantas que atraem pássaros, tais como as aroeiras, os mamoeiros, e outras que as empresas especializadas da cidade poderão indicar, e vendê-las.

No Parque Augusto Franco vivem canários da terra, ave quase em extinção em Sergipe.

Aracaju pode e deve ser uma cidade do verde e das aves.

O JANOTINHA DÓRIA E A PROVA DAS FATEIRAS

O janota que tapa o nariz com lenço de cambraia perfumado a proteger-se do cheiro de povo, tomou gosto pela política. É inteligente, sem duvidas, mas ao seu ego só iguala-se a esperteza untuosa, que aqui pelo nordeste atribuímos aos manhosos.

O janotinha inaugurou nova forma de gestão: está administrando por controle remoto.     Coleciona insucessos, e a farsa vai sendo descoberta pelos paulistanos ludibriados.

Depois de retirar cobertor de morador de rua, jogar água fria e demolir casa em cima de moradores drogados, achou agora uma ração de pobre, imiscuindo-se numa experiência ainda em andamento, feita por organizações sociais que desejam reduzir o enorme desperdício de alimentos.

Assumindo ares de pastor, deu nome à farinha experimental: ¨farinata abençoada¨. Quando ouviu objeções referentes aos hábitos alimentares das pessoas, respondeu como uma Maria Antonieta, usando calças: ¨Você acha que gente humilde, gente pobre, gente miserável, que lamentavelmente está nas ruas de São Paulo, vai ter hábito alimentar? Se ele se alimentar ele tem que dar graças a Deus¨.

O dândi imaginando-se nos salões parisienses do século 19, pensa compensar com a pose de pavão, o vazio que tem na cabeça. É convidado especial do presidente do nosso Tribunal de Contas para vir fazer palestra em um Seminário sobre Drogas, Políticas Públicas e Direitos dos Dependentes Químicos. Mas logo ele, que usou a tragédia humana da Cracolândia  para fazer marketing pessoal?

Dória não seria a pessoa mais qualificada, por expertise ou padrão moral, para vir nos transmitir conhecimentos e exemplos. É condenado por invasão de terras públicas, e acusado de desvio de recursos quando presidiu a EMBRATUR no governo Sarney.

Os que forem ao tal seminário irão ouvir o janotinha repetir aquela conversa sebosa dos ¨autoajudeiros¨, nos quais ainda acreditam ingênuos desavisados.

Em vez de protestos contra o janota que quer ser presidente, melhor seria sugerir-lhe que se submetesse, de boa vontade, ao ¨teste das fateiras¨, indispensável para quem quer mesmo sentir o ¨cheiro de povo¨.

Na eleição de 1994, disputavam o governo Jackson e Albano. JB, no auge da sua popularidade e carisma, visto como o legítimo representante dos sentimentos populares percorria as feiras livres do interior, e logo se dirigia aquele local, digamos assim, insalubre, onde as fateiras realizavam o seu trabalho. Em grandes bacias jogavam as vísceras de bois, porcos, carneiros, e lavavam tudo com uma água que logo virava pasta escura e pegajosa de excrementos e sangue. JB chegava, as fateiras levantavam-se e corriam para abraçá-lo.

No final da acirradíssima campanha, Albano, nascido em berço de ouro, há 12 anos pisando os tapetes da CNI, e do Senado, desacostumado com cenas assim, tão literalmente cruas, chegou à feira de Itaporanga, perguntou onde era o local das fateiras, e para lá se dirigiu, sem ouvir conselhos dos que lhe advertiam sobre o quadro comparável aos castigos horrorosos do inferno de Dante.

Cercado e abraçado pelas fateiras, Albano acabou com a camisa fina de linho azulada parecendo um usado pano de chão. Não se soube se agregou votos, mas saiu com a certeza de ter sido aprovado no radical  ¨teste das fateiras¨.

Será que o Janotinha toparia o desafio?

TRÊS PERSONAGENS EM BUSCA DE UM AUTOR

A oposição em Sergipe circunscreve-se, ou gira em torno hoje, dos senadores Valadares, Amorim, e do deputado federal André Moura.

Os três agem em faixa própria, o trio é carente. Talvez sejam personagens em busca de um autor, de um líder que lhes traçasse um objetivo comum. Mas isso não existe, e pelas características de cada um, jamais acontecerá.

Antes, Edivan Amorim, por bem ou por mal, a última alternativa parece a mais exata, haja a vista as danosas consequências, no rastro do seu tempo de comando, era, apesar de tudo, o ponto central de onde se irradiavam as iniciativas, as articulações. Depois de tantos insucessos, mágoas, e até indignações, entre seus amigos, Edivan preferiu dedicar-se mais aos seus sempre problemáticos negócios do que à politica, até porque, para ele, sem ¨fontes de abastecimento¨ fica difícil avançar.

André, hoje um forte ponto de referencia no tumultuado panorama de Brasília, decidiu comportar-se mais como deputado sergipano do que integrante restrito a um grupo. E cresceu, sem dúvidas. Desperta algumas ciumadas e vai contornando as restrições, compensando má vontade, com adesões que recebe de tantos prefeitos. E fará isso enquanto houver porta que possa abrir em Brasília.

Amorim, retirou das suas ações a marca da hostilidade pessoal, e não perdeu com isso, seguindo aliás os passos distantes da miudeza provinciana, ensaiados por André. No episódio da emenda impositiva de bancada, a posição de André, e Amorim, que dialogam, contrastou com a radicalidade do senador Valadares, que pretendia negar acesso de Jackson a qualquer recurso, e foi derrotado. No final, ambos os lados saíram ganhando, e Valadares não perdeu de todo, porque o deputado Valadares Filho já havia engatilhado uma outra emenda que atendia aos seus interesses.

Valadares, após a derrota do seu filho em Aracaju, colocou-se como adversário inconciliável e implacável de Jackson, o mesmo que fizera com o PT, quando aderiu ao impeachment de Dilma. Rompeu com Temer, perdeu postos federais e aprofundou o fosso com o Planalto, votando contra Aécio. Tomou a atitude correta, ganhou aplausos populares, mas permanece dentro do seu grupo como um estranho no ninho.

Entre os três, é o que exibe nas pesquisas o mais consistente potencial de votos, mas sabe que isso não será levado em conta. Teria então de refazer caminhos, criar alternativas, que até poderiam passar por uma reaproximação com o PT, e uma improvável reconciliação com Jackson e Belivaldo, o que todos dizem repelir até com muita ênfase.

Valadares Filho teria mais campo desimpedido para essas delicadíssimas empreitadas. O senador Valadares pode esperar, até quando André Moura decida candidatar-se mesmo à reeleição. Ai, seu lugar de senador na chapa de Amorim candidato ao governo, cairia do céu, se é que ele esperaria com entusiasmo um ¨presente¨ desse tipo, sem ter a certeza  de que André  o ajudaria. Mas isso seria resolvido com facilidade, se o ex-deputado Reinaldo Moura, pai de André, e que não morre de amores por Valadares, aceitasse compor a chapa como primeiro suplente.

Enquanto isso, passam as nuvens da política, erráticas, imprevisíveis.

¨ESSE CARA TEM HISTÓRIA¨

Em Teresina, durante a solenidade em que o governador Welington Dias condecorou o governador Jackson Barreto com a medalha do Mérito Renascença, maior honraria do Piauí,  o Secretário de Comunicação  Sales Neto, que estava na plateia, enquanto era lida a biografia do homenageado, ouviu um senhor muito empertigado ao seu lado,  virar-se para uma senhora que o acompanhava e dizer: ¨Esse cara tem uma história bonita¨. JB nos últimos meses recebeu as maiores homenagens prestadas pelos governos de Minas, Goiás, e agora do Piauí.

Não é coisa comum um político brasileiro com mais de 50 anos desenvolvendo atividades públicas, ser assim reconhecido por ter uma folha limpa, coerência política que o mantem do mesmo lado de quando iniciou-se na política. Fez sempre as correções que o tempo impôs, para não frustrar-se na desatualização com o mundo e o evoluir da História, sem perder a motivação básica da proximidade com o povo, da luta pela justiça social e ampliação do conceito de democracia. JB, peemedebista histórico, recusou-se a dar apoio pessoal ao impeachment de  Dilma, todavia, manteve laços institucionais com o novo governo.

Dialogou com adversários, aproximou-se de quem poderia ajudar a Sergipe, e nisso teve a compreensão de vários ministros, do deputado André Moura. Ampliou as bases de apoio na Assembleia, reatou a amizade pessoal com a senadora Maria do Carmo, e tudo isso ajudou Sergipe a alcançar resultados. Na história de vida de Jackson inclui-se a fase difícil do regime autoritário ao qual fez oposição, e esteve na linha de frente da luta pela redemocratização, nas Diretas Já, na eleição de Tancredo.

Hoje, ultrapassando os 70 anos, entendendo que é preciso acabar divergências pessoais e somar forças por Sergipe, refaz até seu estilo incisivo de fazer política, para manter abertas as oportunidades ao entendimento, ao diálogo.

LIVROS, LIVROS, LIVROS

- Uma noite de autógrafos de Albano Franco não é coisa comum ou evento corriqueiro. Na noite de quinta-feira, 19, ele esmerou-se em autografar o livro, levantar-se para o abraço e a fotografia por mais de 300 vezes, segundo calculam. O livro Artigos Globais e Outros Textos Esparsos, é coletânea de escritos que condensa, de certa forma, a longa experiência politica do autor, sua participação empresarial, a preocupação com a modernidade, o desenvolvimento econômico.

Na multidão de amigos, entre outros, os que viajaram para virem abraçar o autor, estavam o megaempresário João Carlos Paes Mendonça, o jornalista mais lido da imprensa brasileira, o sergipano Ancelmo Góis, com a esposa, a escritora Tina Correia, que  em seu livro de estreia, Essa Menina, De Paris a Paripiranga, ganhou destaque nacional.

- A Cumbuca já rola de mão em mão. É revista que valoriza essas tão apregoadas tradições culturais sergipanas. Tradições, aliás, que nem restariam lembradas ou cultuadas não fosse o trabalho de ¨out-siders¨ como o poeta Amaral Cavalcanti, editor da revista, por sinal, viabilizada por tantos apadrinhamentos decisivos que recebe. Uma outra out-sider a indomável e incansável Ilma Fontes, subscreveu o catálogo sobre o pintor Álvaro Santos, nessa onda de publicações que estamos a assistir nesse reviver cultural.

- Organizado pelo médico e acadêmico Lúcio Prado já está nas prateleiras das casas que vendem livros, um que certamente será muito procurado. Reúne escritos de muitos médicos literatos e chama-se sintética e sabiamente: VIDA.

- Itabaiana faz feira diferente da que costuma fazer: é a feira de livros que percorre todo o fim de semana. Ali acontece a Quarta Bienal do Livro. Tenham certeza: a Bienal literária itabaianense começa a se transformar em evento nacional. No Shopping, há pouco inaugurado, transcorrem todos os eventos da bienal que incluem seminários, palestras, debates e a boa convivência de quem gosta de ler e também escrever.

TODOS NO RUMO DE XINGÓ


O cenário de Xingó torna-se cada vez mais o palco atraente para uma variada gama de esportes. O cenário é amplo, espalha-se ao longo do lago extenso do rio, que embora  definhante oferece a oportunidade para práticas radicais, como a descida em caiaque das corredeiras. Em Canindé, base principal para as saídas em catamarãs, escunas e lanchas, situa-se o maior complexo  de equipamentos turísticos, em Poço Redondo o Eco Parque a Grota do Angico, onde morreram Lampião e seu bando.

Do outro lado, Piranhas, a histórica cidade alagoana, seguindo o lago, por Delmiro Gouveia até Paulo Afonso, há áreas de lazer, restaurantes, pontos de parada para quem pratica esportes náuticos, o mais popular agora o stand-up. Hotéis e pousadas, a começar por Canindé e Piranhas, existem em todos os outros municípios.

Paulo Afonso é uma cidade com mais de duzentos mil habitantes cercada por barragens do complexo hidrelétrico, onde se realizam competições de vela. Em Canindé em junho deste ano se fez o maior passeio ciclístico já realizado em Sergipe, Foram mais de mil e trezentos participantes.

Houve o patrocínio da MF-Tour, Prefeitura de Canindé e Xingó-FM. Em Canindé há trilhas tanto para ciclistas como para caminhantes dispostos a subir e descer serras, atravessar caatingas.

No começo deste mês um grupo de ciclistas fez o percurso de 210 quilômetros desde Aracaju, finalizando em Canindé. Queriam estrear uma rota para ciclistas outros, que se aventurem a percorrê-lo. É empreitada para atletas com muito folego, mas, que eles garantem valer a pena.

Ernanes, 52, Roberto Silva, 42, Junior Guedes, 32, Adelmo 36, Marquinhos 39 e Rael 31, foram os atletas que venceram o desafio em nove horas e cinquenta e um minutos. Houve paradas para descanso e hidratação, além de um almoço leve em Glória. Em todo o percurso a companhia de uma ambulância da Prefeitura de Canindé.

DO RIO POXIM AO AQUÍFERO MARITUBA

Ailton Rocha, especialista em recursos hídricos, um engenheiro e agrônomo que vive permanentemente empenhado em tocar à frente bons projetos, entusiasmou-se com a ideia de uma ação conjunta do governo do estado e das prefeituras de Aracaju e São Cristovão, com o propósito de cuidar bem do Poxim.

O rio está fortemente poluído. Começa em São Cristóvão passa pelos terrenos do campus da UFS, atravessa uma área onde existem favelas amontoadas nas margens já em Aracaju, e recebe uma carga de esgotos. Cruzando a cidade o rio chega ao manguezal da 13 de Julho para encontrar-se com o Sergipe, e é justamente ali onde há uma descarga forte da pestilência que desce pelo canal Tramanday e de outros locais.

O Secretário da Casa Civil Belivaldo Chagas coordena o projeto, e já ouviu pareceres diversos,  entre eles o de Ailton, que sugeriu um trabalho inicial de dragagem do leito do Poxim.  Isso, segundo ele, além de limpar o rio fará dele um escoadouro com capacidade maior para receber as aguas pluviais, compensando a deficiência do nosso sistema de escoamento numa cidade ao nível do mar. Segundo Ailton, a área de expansão de Aracaju poderá aumentar a vulnerabilidade às inundações, caso não haja escapamentos seguros até o mar.

O intenso processo de impermeabilização do solo urbano amplia o perigo, e é preciso com urgência tratar-se de criar áreas verdes e desobstruir canais. Ailton vê ainda com muito otimismo os trabalhos que se realizam conjuntamente com órgãos estaduais municipais e federais, tendo em vista a criação de uma reserva ambiental na Barra dos Coqueiros, onde, adverte ele, existe o aquífero Marituba, o mais importante de Sergipe.

É preciso manter no seu entorno uma área verde ampla para assegurar a sua recarga e evitar que a urbanização em torno venha a contaminá-lo, risco que se amplia agora com a instalação de indústrias. O grupo que constrói a termoelétrica na Barra assumiu o compromisso de patrocinar projetos culturais e ambientais, e até, indo além das suas atribuições especificas, assegurou a Jackson, que após a obra de manutenção do Tobias Barreto irá ¨apadrinhar¨ aquele teatro.

A DISPUTA INÚTIL POR SUKITA

Travam agora grupos políticos e partidos uma disputa intensa pelo passe de Sukita o inquieto e sempre carregado de problemas a resolver, ex-prefeito de Capela. Que ele tem votos ninguém duvida, mas isso não é garantia nenhuma de que possa efetivamente vir a ser candidato.

E NEM DORMIRAM NA CADEIA: ESTÃO SOLTOS

Quatro bandidos, um deles menor, assaltaram uma escola em Capela. Fizeram um arrastão, deram tiros, ameaçaram as pessoas. Estavam todos encapuzados. Um professor de História foi ferido na mão, uma funcionária grávida e vários alunos foram ameaçados e agredidos, tudo num clima ensandecido de violência e desrespeito. A polícia prendeu três e um está foragido.

A juíza da Comarca depois de um daqueles arrazoados longos que em casos como tal deveriam ser dispensados em nome da presteza e celeridade da Justiça, ainda infelizmente apegada a uma burocracia, absolutamente inútil e retrógrada, diante das circunstancias que vivemos, decidiu manter, um, em prisão preventiva, e soltar, ¨com as devidas cautelas¨ um outro marginal.

Já o menor que não pode ser preso, mas poderia ser apreendido, também foi solto com as mesmas ¨cautelas¨. Como ninguém estará por perto para fiscalizar o cumprimento das “cautelas”, eles, com certeza, irão cometer outros crimes, ou no mínimo ajudarem o que está foragido a permanecer solto. É por coisas assim, absurdas, num país onde a violência e a ousadia dos bandidos, tanto engravatados como pés-rapados, aterrorizam a sociedade, que os policiais andam desmotivados com a tarefa que a eles incumbe: enxugar gelo.

A OPERAÇÃO NAVALHA E A NAVALHA NA CARNE

A chamada Operação Navalha ocorrida há onze anos, marcou em Sergipe e Bahia o início do protagonismo forte do Ministério Público e Polícia Federal em ações que estrearam a série em capítulos sucessivos, e que se desenrolam até hoje em todo o país, e nelas se sobrepõe a Lava Jato. Era o inicio alvissareiro com certeza, do sistema que compõe a Justiça, voltando-se para o desafio de superar a grande vergonha nacional: a impunidade garantida aos crimes do “colarinho branco”.

Em Aracaju, a navalha atingiu pessoas da alta cúpula da governança e do empresariado. Causou enorme impacto, e na época o ex-governador João Alves, indignado como pai por ver  um filho envolvido, chegou a considerar que sofreria uma retaliação com origem no Palácio do Planalto onde estava o presidente Lula. Verificou-se, depois, que as coisas não eram bem assim, quando ficou clara a independência como agiam os protagonistas das operações, envolvendo o judiciário, MPF e Policia Federal. Houve, de inicio, sem duvida alguma uma espetacularização, e também alguns desnecessários constrangimentos, como as algemas nos pulsos de quem absolutamente não representava perigo, além do ate certo ponto espalhafatoso aparato policial.

Afinal, havia, o justo entusiasmo dos agentes da lei pela quebra do paradigma deplorável, de que no Brasil só ia para a cadeia, pobre preto e prostituta. Desde aquele tempo os cubículos das penitenciárias começaram a ser abertos, democraticamente, para frequentadores oriundos de todos os níveis sociais. Não é coisa a se festejar, pois o desejável seria que nunca houvesse motivos para que as prisões ocorressem. Mas, como uma coisa é o desejo, o sonho, e outra, mais crua e azeda é a realidade, o nivelamento igualitário do ¨pé-rapado¨ com o engravatado se fazia necessário, para suprir uma carência de justiça que desmoralizava o pais.

Onze anos se passaram, ações punitivas foram desencadeadas, prisões inúmeras, grandes empresas atingidas, figuras de proa da política e dos negócios encarceradas, e temos agora uma Organização Criminosa, comandada pelo próprio Presidente da República, que desafia o bom senso, a Justiça, e continua devastando as instituições para manter, a ele, e a toda a quadrilha, debaixo da sombra da impunidade assegurada. Mas essa já é outra história.

Da Operação Navalha chegou agora o resultado da navalha na carne, que cortou profundamente  o corpo, e certamente a alma de cidadãos que gozavam  de conceito positivo na sociedade, e ocuparam cargos proeminentes na administração pública.

Os operadores do direito são unanimes em ressaltar a competência profissional, a isenção e a ética da magistrada Telma Maria Santos Machado, titular  da 1º  vara da Justiça Federal em Sergipe, mas fazem observações sobre a dosimetria das penas aplicadas, todavia,  ressaltando ainda que a sentença da Juíza cercou-se de uma fundamentação muito firme na construção jurídica, e do ponto de vista  das provas fáticas.  Aos acusados, agora condenados em primeira instancia, resta a alternativa de aprimorarem as suas defesas e recorrerem à segunda instancia. Por enquanto devem merecer a presunção da inocência.

Quase sempre a mídia prefere dar muito mais espaço aos que são condenados, recebem penas, deixando, o que é lamentável, quase na obscuridade os nomes dos que são absolvidos, e se fazem merecedores de publicidade ainda maior, para que se desfaça ou compense as atribulações que viveram.

Aqui destacamos: o engenheiro RENATO CONDE GARCIA, na época diretor da DESO, foi absolvido por absoluta ausência de provas contra ele.

A AVENIDA DR. JOSÉ AUGUSTO BARRETO

A avenida tem curta extensão começa quase na descida da ponte ao lado do Quality Hotel, e faz o contorno envolvendo o Shopping RioMar, estabelecendo adiante, um enlace com a avenida  Delmiro Gouveia. Tudo isso evidentemente na Coroa do Meio, facilitando o trânsito que por ali mais e mais se complica. A nova avenida que também propicia uma outra  perspectiva para a contemplação do manguezal e da orla da 13 de julho, recebeu o nome do médico humanista  que recentemente encerrou sua passagem, Dr. José Augusto Barreto. O prefeito Edvaldo Nogueira acertou duplamente: na avenida e na homenagem.

A RENDA IRLANDESA, AS RENDEIRAS E O PAPA

(Um trabalho magnífico como todos da lavra da professora Beatriz Gois Dantas - Antropóloga, profa. emérita da UFS, membro do IHGSE e da ALL) que reproduzimos:

A Igreja Católica, com sua perspectiva universalista, tem multiplicado santos e invocações à Virgem Maria. Assim, a Mãe de Jesus ganhou denominações diversas entre as quais a de Nossa Senhora Divina Pastora. A devoção surgida na Espanha, no início do século XVIII, ganhou adeptos também em Sergipe. Foi na zona da cana onde seu culto se tornou mais forte, como indica o grandioso e belíssimo templo erigido em honra da Virgem que é representada tendo ao seu lado o Menino Jesus cercado de carneiros, constituindo-se em cena bucólica de um lirismo campestre. Essa imagem orna o altar-mor da igreja matriz da cidade sergipana que também recebeu seu nome e se colocou sob sua proteção: Divina Pastora.

No mês de outubro, a cada ano, uma considerável massa de aproximadamente cem mil pessoas, formada por fiéis, romeiros, pagadores de promessas e turistas, desloca-se em peregrinação à pequena cidade num magnífico espetáculo de religiosidade. Esse grande evento, contrasta com a rotina da plácida urbe que, no seu dia a dia, abriga o trabalho silencioso de mais de uma centena de rendeiras a produzirem, artesanalmente, a renda irlandesa, um dos mais belos e sofisticados trabalhos feitos pelas mulheres sergipanas.

Resultante da transposição e adaptação de velhos saberes e trabalhos femininos trazidos da Europa, a renda chegou ao Brasil através de livros do século XIX, em versão francesa, ou diretamente através do trabalho de mulheres que aprenderam a arte por meio dos processos informais de observação e transmissão oral. O fazer da renda foi aqui apropriado por freiras recolhidas em conventos, damas da sociedade e moças pobres que precisavam ganhar dinheiro. Em Divina Pastora, difundiu-se quando os engenhos de açúcar começaram a declinar, constituindo-se em opção de trabalho para as mulheres.

Tecida com agulha e linha que vai preenchendo, ponto por ponto, o desenho delineado pelo lacê (cordão achatado) costurado num papel grosso, o fazer da renda é atividade vagarosa, que exige conhecimento da técnica e dedicação da artesã na elaboração do belo trabalho.

Em Divina Pastora, muitas rendeiras investiram os poucos ganhos com a renda irlandesa em educação, frequentando escolas e tornando-se professoras e rendeiras ao mesmo tempo. Apoiadas nas redes tradicionais de produção artesanal, nos programas de governo ou em agências particulares de promoção de artesanato, as rendeiras ganharam visibilidade. Organizadas em associações, enfrentaram melhor as dificuldades decorrentes da aquisição da matéria-prima – um óbice sempre presente –, passaram a frequentar feiras e a renda ganhou espaço e conquistou novos mercados.

Os ganhos não foram apenas econômicos, mas também simbólicos. A renda irlandesa de Divina Pastora ganhou a mídia, os museus e o reconhecimento oficial com o título de Patrimônio Cultural do Brasil. Alegraram-se as rendeiras vendo sua renda ocupando espaços nos palácios, sendo mostrada nas redes de televisão, em desfiles de moda e largamente consumida sob a forma de peças diversas que foram criando ao longo do tempo.

Quando a atriz Global Regina Duarte, adquiriu ao vivo uma toalha de renda irlandesa num programa da TV Cultura anos atrás, foi uma consagração para as rendeiras. Maior que esta, porém, foi o orgulho com que produziram uma estola, parte da indumentária ritual dos sacerdotes, destinada ao Papa Francisco. Peças sacras como estolas, toalhas para altares e panos de sacrário integram, desde muito, o rol dos objetos por elas produzidos para adornar igrejas e mimosear padres. Todavia, ver sua renda chegar ao Sumo Pontífice, o chefe maior da Igreja Católica, foi experiência única para essas mulheres, devotas da Divina Pastora.

A façanha envolveu tramas diversas e fios puxados pelo presidente da Federação Brasileira de Academias de Medicina, o médico José Hamilton Maciel da Silva, um alagoano radicado em Sergipe desde os anos setenta. Empenhado em ampliar o intercâmbio internacional da entidade que dirige, planejou viagem realizada por mais de trinta companheiros e visitou entidades médicas na França, na Suécia e na Itália. Foi recebido pelo Papa e entregou-lhe a estola feita pelas mulheres rendeiras de Sergipe.

Na história das rendeiras de Divina Pastora, este é um fato que será relatado e realçado ao lado de muitos outros, que constituem a longa saga dessas mulheres, mestras e guardiãs de um saber, em cujas tramas se cruzam tradições europeias retrabalhadas na contemporaneidade. Vida longa e sucesso às rendeiras de Divina Pastora e ao Papa Francisco.

JUSTIÇA E GRATIDÃO

(O texto deslumbrado do poeta Amaral Cavalcanti com a exposição e o catálogo das fotos de Waldemar Lima)

Participei das homenagens prestadas pelo TCE/Se. ao fotógrafo Waldemar Lima, um sergipano de merecido destaque na arte cinematográfica, companheiro de Glauber Rocha na invenção do Cinema Novo.

Waldemar, com uma câmera na mão e o tropicalismo na cabeça, imprimiu aquela luz absurdamente tropical que caracteriza a produção do cineasta baiano em filmes cult como “Deus e o Diabo na Terra do Sol” e “Barravento”.

Do elogiável trabalho da Equipe comandada por Clóvis Barbosa, no TCE - que vem tratando de reavivar na memória dos sergipanos os heróis esquecidos da sua cultura - resultaram um livro sobre o homenageado organizado por Marcos Cardoso, um filme documentário produzido por Pascoal Maynard e uma exposição de fotos antigas de Aracaju pontuadas por trechos de poemas de Luiz Eduardo Oliva.

Uma justa homenagem, sobretudo oportuna. Na solenidade, o que mais me tocou foi a manifesta gratidão de Clóvis Barbosa - investido da honrosa condição de presidente do nosso Tribunal de Contas - a Djaldino Mota Moreno, seu mentor cultural na juventude quando integrava a JOVREU, com quem aprendeu a valorizar a arte e a cultura como essenciais à formação integral do cidadão.

Em grande parte do seu discurso, o bem sucedido advogado e homem publico revelou que foi sob a liderança de Djaldino que aprendeu a apreciar e a fazer cinema, a promover encontros e debates culturais e, principalmente, a ser um cidadão socialmente correto.

Djaldino estava lá, ancho de satisfação, a receber a benéfica gratidão do seu antigo pupilo com os olhos marejados; uma sensação que deveria ser estendida a tantos que, como ele, estiveram algum tempo removendo da pasmaceira provinciana que até hoje nos acomete, as mais brilhantes individualidades.

E como este reconhecimento torna-se cada dia mais raro entre nós, confesso que tive inveja de Djaldino.

Amaral Cavalcante – 29/10/17

 

 

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